A Humanidade já foi contemplada com três revelações. A
primeira, quando da vinda de Moisés. Nela, o monoteísmo tomou forma e Deus foi
apresentado como o único Deus verdadeiro, em oposição ao politeísmo. Na
segunda, quando do advento de Jesus Cristo, foi Deus apresentado como Pai de
infinita misericórdia e amor, substituindo o Jeová dos Exércitos, temível e
justiceiro. A terceira revelação surge com o advento do Espiritismo, cuja
finalidade básica é restabelecer em princípios as primícias dos ensinamentos de
Jesus Cristo.
A História conta que, no decorrer dos séculos que sucederam
o advento de Cristo, houve numerosas tentativas no sentido de comprovar a
realidade dos Espíritos e sua manifestação no plano material. É inegável que
algumas chegaram a ser reveladas. Contudo, com maior amplitude, isso se tornou
possível apenas no século 19, quando os homens estavam mais preparados para uma
nova revelação. Um sopro de vida nova parecia agitar o planeta neste momento de
efervescência intelectual, onde as ciências tomavam grande impulso, onde tudo
era revelado à luz natural da razão. Surge assim a Doutrina Espírita, marcando
a passagem das religiões formais para uma filosofia racionalista. Trata-se,
portanto, não de uma negação do passado histórico, mas constitui antes uma
síntese dialética de todo o processo da história do pensamento, colimando
sempre uma busca de racionalização das concepções fideístas dogmáticas. Seu
esforço, portanto, consiste em trazer a religião do domínio mítico para o plano
cultural.
Pode-se afiançar que os primeiros precursores do
Espiritismo foram os famosos médiuns Emmanuel Swendeborg e Andrew Jachson
Davies. Muitos fenômenos marcaram o início da Doutrina Espírita, atraindo a
atenção de numerosos sábios de renome mundial. Surgiu, então, no cenário do
mundo a figura exponencial de Allan Kardec que buscou estudar e fundamentar
cientificamente esses fenômenos, assim como organizar de forma sistemática e
metódica os ensinamentos revelados pelos Espíritos.
Conseguiu assim lançar o arcabouço de uma nova doutrina,
dando à publicidade O Livro dos Espíritos, em 1857, contendo os fundamentos
filosóficos da Doutrina. Em seguida publicou O Livro dos Médiuns, em 1861,
contendo a parte científica das relações do plano espiritual com o mundo
material, e por último O Evangelho Segundo o Espiritismo, em 1864, contendo a
parte religiosa e essencial da Doutrina. É assim que a Doutrina Espírita possui
um aspecto tríplice. Ela consiste em uma Ciência —que tem por objeto os
fenômenos; uma Filosofia— que tem por objeto as causas primárias do Universo, a
natureza dos Espíritos e as Leis Morais; e em uma Religião —que tem por objeto
resgatar a essência dos ensinamentos cristãos. Sob esse aspecto o Espiritismo
diferencia-se das demais religiões, pelo fato de não possuir nenhuma formalidade
ou culto exterior, mas a religiosidade deve dar-se na intimidade do próprio
indivíduo, através da prece e da doação de si. O que interessa não é a
exterioridade dos ritos e do culto convencional, por vezes precários, mas sim o
pensamento e o sentimento do homem.
Há uma sequência histórica que não se pode esquecer ao
tomar a Bíblia nas mãos. Quando o mundo se preparava para sair do caos das
civilizações primitivas, surgiu Moisés, como o condutor de um povo destinado a
traçar as linhas de um novo mundo e, de suas mãos surgiu a Bíblia. Não foi
Moisés quem a escreveu, mas foi ele o motivo central dessa primeira codificação
do novo ciclo de revelações: o cristão. Mais tarde, quando a influência bíblica
já havia modelado um povo, e quando este povo já se dispersava por todo o mundo
gentio espalhando a nova lei, apareceu Jesus e, de suas palavras, recolhidas
pelos discípulos, surgiu o Evangelho.
A Bíblia é a codificação da primeira revelação, o código
hebraico em que se fundiram os princípios sagrados e as grandes lendas
religiosas dos povos antigos. É a grande síntese dos esforços da antiguidade em
direção ao espírito. O Evangelho é a codificação da segunda revelação, a que
brilha do centro da tríade dessas revelações, tendo na figura de Cristo o sol
que lança sua luz sobre o passado e o futuro. Mas assim como na Bíblia (Antigo
Testamento), já se anunciava o Evangelho, também neste aparecia a predição de
um novo código, o do Espírito da Verdade: O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Sua finalidade é esclarecer os ensinos anteriores de acordo com a mentalidade
moderna, já suficientemente arejada e evoluída para entender as alegorias e
símbolos contidos na Bíblia e no Evangelho. Enganam-se os que pensam que a
codificação do Espiritismo contraria ou reforma o Evangelho.
Em O Evangelho Segundo o Espiritismo são abordados textos
desde os decálogos de Moisés e essencialmente os ensinamentos de Jesus em sua
maioria até as cartas de Paulo, de forma didática e esclarecedora. São
estudadas as Leis Morais tratando-se especificamente da aplicação dos
princípios da moral evangélica, bem como das questões religiosas acerca da
adoração, da prece e da prática da caridade. Nessa parte o leitor encontrará
inclusive as primeiras formas de instruções dos Espíritos, com a transcrição de
comunicações por extenso e assinadas, sobre questões evangélicas.
Assim sendo, o Espiritismo tem como base as escrituras, tem
seus fundamentos na Bíblia. A essência de sua doutrina é o Evangelho, a
religiosidade. Trata-se, portanto, de uma religião positiva, baseada nas leis
naturais, destituída de aparatos misteriosos e de conotação mítica ou mística.
Trata-se, ainda, de uma religião dinâmica, pois coloca a prática da caridade
acima de qualquer virtude (I Cor 13:1). Sem dúvida, a prática da caridade
guarda íntima relação com os princípios universais de Jesus Cristo, ao
sintetizar o Decálogo neste mandamento maior: Amar a Deus sobre todas as coisas
e ao próximo como a si mesmo (Mt 22:34). Ser cristão não é um rótulo, mas uma
vivência (Mt 7:21), é imprescindível que o homem se revele pelas suas obras: a
fé sem obras é morta.
Com relação à fenomenologia mediúnica, a Doutrina Espírita
não aceita o milagre ou o sobrenatural, mas explica tudo à luz da naturalidade.
O ministério dos anjos, esse ministério divino, a que o Apóstolo Paulo se
referiu tantas vezes, é exercido através da mediunidade. A própria Bíblia nos
relata uma infinidade de comunicações mediúnicas. Veja-se as palavras do Rei
Samuel, em Provérbios 31:1-9, que, segundo o texto bíblico são "a profecia
com que lhe ensinou sua mãe". Temos ali uma comunicação espírita
integralmente reproduzida na Bíblia.
É importante distinguir o fato de que os estudos bíblicos
se processam em duas direções diversas: há o estudo normativo das instituições
religiosas, legados a várias igrejas e que seguem as regras da hermenêutica; há
o estudo livre dos institutos universitários independentes, que seguem os
princípios da pesquisa científica e da interpretação histórica. O Espiritismo
não se prende a nenhum dos dois sistemas pois sua posição é intermediária.
Reconhecendo o conteúdo espiritual da Bíblia, o Espiritismo estuda à luz dos
seus princípios em harmonia com os métodos da antropologia natural e dos
estudos históricos.
Segundo afirmação de Jesus em João, capítulo 10 "eu e
o Pai somos um". Desta forma todos os homens possuem uma unidade
essencial. Daí a importância de viver uma religião unitária em essência e
verdade - o ecumenismo - apesar da variedade das formas em que se expressam.
Fonte: Portal do Espirito (Astrid Sayegh)