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quarta-feira, 5 de junho de 2019

A CANDEIA DEBAIXO DO ALQUEIRE

Na parábola da Candeia Jesus encoraja cada indivíduo a ser o arquiteto de sua própria evolução espiritual, enfatizando a importância da autotransformação moral. Este ensinamento convida-nos a refletir profundamente sobre nossa trajetória e responsabilidades, destacando que, em nossas mãos, está a capacidade de moldar nosso caráter e destino através da introspecção e do compromisso moral.

A parábola traz o seguinte texto em Lucas 8, 18 a 18: 


Ninguém, acendendo uma candeia, a cobre com um vaso, ou a coloca de baixo de um leito, mas coloca-a sobre o candeeiro para que os que entram vejam a luz. Porque não há algo escondido que não se torne manifesto, nem oculto que não venha a ser conhecido e manifesto. Vede, pois, como ouvis; pois quem tiver, a ele será dado, e quem não tiver, até o que parece ter será tirado dele.


A verdadeira essência da parábola da Candeia demanda uma análise minuciosa de cada versículo individualmente. Esse exercício de reflexão detalhada nos permite capturar e compreender plenamente a mensagem que Jesus desejava transmitir.

1-Ninguém, acendendo uma candeia, a cobre com algum vaso, ou a põe debaixo da cama; mas põe-na no velador, para que os que entram vejam a luz. 

Candeia era um instrumento essencial de iluminação durante a época de Jesus, alimentada por óleo e comumente encontrada em todas as residências. Era tradicionalmente posicionada em lugares elevados dentro das casas para garantir uma distribuição eficaz da luz no ambiente. 

Na parábola da candeia, Jesus utiliza esta simbologia para nos encorajar a uma introspecção profunda, buscando a iluminação de nosso íntimo. Ele nos alerta sobre as densas sombras internas que frequentemente originam atitudes, comportamentos, reações, pensamentos e palavras que podem surpreender e perturbar a própria pessoa que os manifesta. O Mestre nos convida a iluminar essas áreas obscuras de nossa psique para alcançarmos uma verdadeira transformação interior. 

Quantas vezes nos pegamos surpresos por nossos próprios pensamentos, permeados por sentimentos de rancor, inveja, ciúme, ódio ou desejo de vingança? Quantas vezes nos sentimos envergonhados por nossas próprias palavras, ações e comportamentos? Tais manifestações ocorrem porque o psiquismo humano encontra-se, muitas vezes, imerso em profundas sombras, reclamando  iluminação. Este acervo interno obscuro, em diversas ocasiões, se conecta com a espiritualidade de ordem inferior, conforme elucidado no Livro dos Espíritos. E, como destaca Emmanuel no livro "Pensamento e Vida", psicografado por Francisco Cândido Xavier, "todos nós somos capazes de captar as emissões mentais daqueles que pensam como nós". 

Por isso, o processo do autoconhecimento se faz urgente, sobretudo neste tempo de transição planetária. 

Na parábola, a candeia tem como fonte de combustível o óleo. Qual seria o combustível que pode gerar iluminação no campo íntimo, permitindo o ser iluminar suas densas sombras internas? 

Em João 8:32, Jesus nos oferece uma diretriz clarividente: "Conhecereis a verdade e ela vos libertará". 

A verdade é, portanto, o caminho capaz de libertar a criatura humana das próprias sombras internas, libertando-se, assim, de toda dor e sofrimento. Ela é o farol que nos guia, o combustível que ilumina nosso íntimo.

Mas, afinal, o que é a verdade? 

A pergunta foi feita pela primeira vez à Jesus pelo governador da Judeia, Pôncio Pilatos, há dois mil anos, conforme está no Evangelho de João 18, 38.  O Mestre, no entanto, fez silêncio a respeito. 

O espírito Humberto de Campo, no livro Lázaro Redivivo, capítulo 32, psicografia Chico Xavier, esclarece que o silêncio de Jesus à Pilatos se deu porque o conhecimento da Verdade não é um bem transmissível, não se pode conquistá-la por informações alheias, no caminho da vida. A verdade é uma realização pessoal e eterna, que deve ser construída e assimilada gradativamente dentro de cada ser, moldada e compreendida por meio das experiências, reflexões e, sobretudo, da consciência individual.

Se a verdade é o combustível que tem o potencial de iluminar e libertar a alma de suas trevas internas, pavimentando o caminho para o autoconhecimento, então surge a questão inevitável: como podemos alcançá-la? 

No Evangelho de João 14, 6,  Jesus afirma: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vem ao Pai senão por mim". 

Ao confirmar sua conexão plena com Deus, Jesus nos indica que a verdadeira aproximação com o Pai ocorre por meio dele. Suas palavras e ensinamentos, consolidados em seu Evangelho de Amor, são como um farol para todas as almas que buscam esse estado de comunhão divina. O Evangelho, repleto de amor e sabedoria, é o combustível capaz de iluminar os corações e direcionar as almas rumo à verdadeira iluminação.

No entanto, é crucial entender que apenas o conhecimento superficial do Evangelho não basta. A simples leitura e memorização de seus versículos não garantem a transformação interior e a iluminação da alma. 

o adentrarmos nas páginas do livro "Renúncia", ditado pelo espírito Emmanuel e psicografado por Chico Xavier, somos conduzidos aos profundos ensinamentos de Alcione, a personagem central da narrativa. Ela destaca que o Evangelho de Jesus não é apenas um conjunto de palavras ou histórias, mas sim um vasto trajeto de ascensão espiritual. E, para trilhar esse caminho com verdadeira dedicação, não basta somente conhecer suas palavras, mas é essencial meditar sobre elas, sentir sua profundidade e, acima de tudo, vivenciar seus ensinamentos.

Seguindo a perspectiva de Alcione, podemos perceber que a jornada de autoiluminação se desenrola em etapas. A primeira é o conhecimento. Assim como uma candeia precisa ser acesa para iluminar a escuridão, o coração humano precisa do conhecimento do Evangelho para iluminar sua jornada espiritual. Ler e estudar as palavras de Jesus é mais do que um mero exercício intelectual; é o início da ignição interna que clareará todo o ser. Isso constitui o primeiro passo consciente em direção à evolução, o momento em que o indivíduo decide ativamente acender a luz de sua alma através da sabedoria contida nas mensagens evangélicas.

Por outro lado, não basta acender a candeia e colocá-la debaixo do leito, ofuscando-a. Apenas estudar os ensinamentos de Jesus, sem aplicá-los no cotidiano, é o mesmo que ofuscar a luz que foi acesa.

Para sustentar viva a chama da candeia em nosso íntimo, é essencial prosseguir na senda evolutiva que nos aproxima de Deus. É imprescindível, portanto, meditar sobre o conhecimento assimilado. Meditar significa aquietar a mente, permitindo que o ensinamento ressoe no coração. Trata-se de decifrar o texto e compreender sua relevância para a vivência cotidiana, questionando-se: "De que maneira posso incorporar em meu dia a dia o ensinamento de 'perdoar 70x7'? Como posso manifestar em minhas ações o mandamento 'amai-vos uns aos outros'? Como posso vivenciar o princípio de 'atire a primeira pedra quem estiver sem pecado', abstendo-me de julgar o próximo? De que forma posso abraçar as lições de auto-perdão, expressas nas palavras de Cristo 'Vai e não tornes a pecar'?" A lista é extensa, pois os ensinamentos de Jesus são inúmeros e cada um carrega profundas reflexões e orientações para nossa evolução espiritual

Meditar é refletir, visualizando a sua aplicação. 

Sentir e vivenciar o Evangelho exige esforço, disciplina, e uma imensa capacidade de persistência, porque são verbos que conjugam emoções e sentimentos. 

Não é nada fácil para espíritos habitantes de um mundo de provas e expiações, onde o mal prepondera, amar e desenvolver todas as demais virtudes, filhas do amor. Isso acontece porque, como espíritos ainda em processo de evolução, estamos habituados a sentimentos mais rudimentares ligados ao Ego, como egoísmo, rebeldia, orgulho, vaidade e outras imperfeições, ancoradas no interesse pessoal

No entanto, se Jesus veio ao mundo para exemplificar o amor, é sinal que humanidade está pronta para desenvolver esta virtude. Afinal, o amor também se aprende e se desenvolve com exercícios, como ensina o espírito Joana de Angelis, no livro Garimpos de Amor, página 14:

Eis por que é necessário aprender-se a amar, porquanto o amor também se aprende, aprimorando-se incessantemente. Esse aprendizado é feito através de treinamento, de exercícios repetitivos, no início sem muita convicção, para, de imediato, passar-se a senti-lo em forma de bem-estar e de harmonia íntima. 

Mas como exercitar as virtudes? 

Nos tempos atuais, graças a bondade imensa do Criador, a humanidade conta com variados recursos no campo das modernas terapias que auxiliam o ser na modulação de suas emoções, auxiliando-o no processo do autoconhecimento, caso entenda necessário. 

Jesus, em sua sabedoria infinita, nos ensinou que o amor pode ser exercitado e apreendido, conforme está em Mateus 7,12. Quando o ser humano faz aos outros tudo o que gostaria que lhe fosse feito e quando deixa de fazer aos outros o tudo que não gostaria que lhe fizessem, está conjugando o verbo amar. 

A autoiluminação é o convite expresso na Parábola da Candeia, permitindo ao ser evoluir de forma consciente, já que lhe permite ampliar sua visão íntima. Isso o capacita a reconhecer suas falhas morais para transformá-las, alinhando seu psiquismo ao modelo de Jesus.

"Brilhe a vossa luz diante dos homens!" Este é o convite de Jesus. No entanto, para que a luz interna brilhe, é necessário libertá-la das sombras que a encobrem. 

Jesus destaca na Parábola e esclarece que o processo de autoiluminação amplia a compreensão interna do ser no âmbito dos sentimentos e emoções, levando-o ao autoconhecimento

2- Porque não há coisa oculta que não haja de manifestar-se, nem escondida que não haja de saber-se e vir à luz. 

Quando praticamos o autoconhecimento por meio da introspecção, nossas imperfeições morais, nossos sentimentos egoístas e nossas ilusões vão, gradualmente, se tornando evidentes. À medida que trazemos à consciência nossos conflitos e dificuldades internas, torna-se imprescindível aceitarmo-nos, pois possuir imperfeições é próprio da condição humana. Somos espíritos ainda imperfeitos em aprendizado constante. Por isso, devemos trabalhar, com muita paciência, para atenuar as falhas morais identificadas, até que desapareçam por completo. Não devemos negá-las, reprimi-las ou mascará-las, mas aceitá-las, numa postura de quem reconhece estar em processo de construção íntima, guiado por Jesus. 

E, conclui, o Mestre Jesus:

 3- Vede, pois, como ouvis; porque a qualquer que tiver lhe será dado, e a qualquer que não tiver até o que parece ter lhe será tirado.

 Ao nos movimentarmos em direção ao autoconhecimento, trazendo à luz sentimentos grosseiros que estavam ocultos e trabalhando pela sua transformação, mais nos será concedido em termos de força, bênçãos e visão íntima, permitindo-nos prosseguir em nossa jornada de iluminação.

O processo de autoconhecimento nos permite descortinar pseudo-virtudes e falsas manifestações de bondade, humildade e amor, que servem apenas para mascarar nossas verdadeiras imperfeições. Por isso, Jesus diz: “aquilo que parece ter lhe será tirado" – referindo-se às pseudo-virtudes que a pessoa adota para parecer algo que não é, sugerindo que, no processo de evolução consciente, o ser humano, com clareza, desvitaliza as suas próprias máscaras.

O processo de evolução consciente, que leva a conquista da transformação moral, por meio do autoconhecimento, é gradativo, longo e bastante difícil, mas é o único caminho que nos libertará de todo sofrimento e de toda dor. 

Vinde a mim, todos vós que sofreis, e eu vos aliviarei." O caminho que nos conduz a Jesus começa com o entendimento de seu Evangelho de Amor. Ao refletirmos e aplicarmos seus ensinamentos, somos convidados a vivenciá-los em sua plenitude. Apenas ao incorporarmos verdadeiramente a mensagem de Jesus é que chegaremos até Ele, encontrando alívio e uma felicidade genuína. O percurso é árduo, mas tenhamos coragem. É possível triunfar!






sábado, 19 de maio de 2018

PARÁBOLA DAS DEZ VIRGENS



O reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo. E cinco delas eram prudentes, e cinco insensatas. As insensatas, tomando as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo. Mas as prudentes levaram azeite em suas vasilhas, com as suas lâmpadas. E, tardando o esposo, tosquenejaram todas, e adormeceram. Mas à meia-noite ouviu-se um clamor: Aí vem o esposo, saí-lhe ao encontro. Então todas aquelas virgens se levantaram, e prepararam as suas lâmpadas. E as loucas disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas se apagam. Mas as prudentes responderam, dizendo: Não seja caso que nos falte a nós e a vós, ide antes aos que o vendem, e comprai-o para vós. E, tendo elas ido comprá-lo, chegou o esposo, e as que estavam preparadas entraram com ele para as bodas, e fechou-se a porta. E depois chegaram também as outras virgens, dizendo: Senhor, Senhor, abre-nos. E ele, respondendo, disse: Em verdade vos digo que vos não conheço. Vigiai, pois, porque não sabeis nem o dia e nem a hora. Mateus 25, 1-13.

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 Embora muitas interpretações desta parábola tenham um enfoque escatológico, as palavras de Jesus oferecem múltiplas perspectivas. É plenamente possível entendê-la não apenas como uma visão do fim dos tempos, mas também como um convite ao autoconhecimento. 

Ao utilizar elementos de um casamento tradicional judeu como pano de fundo, Jesus destaca a ideia de uma união cósmica e de uma conexão profunda, como um pilar que sustentará todas as outras imagens e mensagens contidas no texto. 

A parábola descreve o encontro de dez virgens com o noivo. Segundo a tradição judaica, durante a cerimônia de casamento, a noiva era acompanhada por suas amigas no trajeto até o noivo. Este, por sua vez, também caminhava em direção à casa da noiva, ladeado por seus amigos. 

No entanto, na parábola, Jesus omite qualquer menção à noiva, focando apenas em suas amigas, as virgens. Isso se dá porque Jesus não alude a um casamento terreno, mas sim à união entre a humanidade — o Seu rebanho — e Ele mesmo, o divino pastor..

Simbolicamente, Jesus é retratado como o noivo da humanidade, conforme evidenciado em Mateus 9:14-17. Essa representação também é reforçada na resposta à questão 309 do livro "O Consolador", ditado pelo espírito Emmanuel e psicografado por Chico Xavier.

Um dos pontos centrais da parábola é a analogia do reino dos céus com as dez virgens que se dirigem ao encontro do noivo. Jesus frequentemente se referiu ao "reino dos céus", utilizando diversas metáforas e elementos cotidianos da vida do povo judeu para facilitar a compreensão. Em Lucas 17:20-21, o Mestre clarifica sua mensagem, declarando que o reino não se localiza externamente, mas reside no interior de cada indivíduo. Isso sublinha que o "reino dos céus" não é um lugar físico, mas sim um estado interno de harmonia, equilíbrio e regência pelo amor incondicional.

É fascinante observar que as virgens, quando comparadas ao reino dos céus, avançam em direção ao noivo. Isso sugere que esse estado interno de harmonia, equilíbrio e domínio pelo amor incondicional não é algo passivamente recebido, mas sim uma conquista ativa. Está intrinsecamente ligado aos movimentos e esforços da alma em sua jornada evolutiva. 

Destaca-se, neste prisma, os movimentos pelo autoconhecimento. Sem essa introspecção e esforço consciente, é impossível transformar emoções e sentimentos desequilibrados em estados mais harmoniosos.

A escolha do número dez na parábola também é significativa. Na tradição judaica, os números carregam profundos significados simbólicos. O número dez, em particular, representa perfeição e totalidade. Assim, as dez virgens podem ser vistas como um símbolo da busca completa e perfeita pela harmonia interior e pelo amor incondicional.

Na parábola, as dez virgens não representam uma unidade perfeita e coesa, pois enquanto metade delas é descrita como prudente, a outra metade é caracterizada como imprudente. Assim, a imagem das dez virgens ilustra uma totalidade que, apesar de completa, possui suas metades em desequilíbrio.

Esta analogia pode ser estendida à humanidade atualmente encarnada no planeta. Em um mundo de provas e expiações como o nosso, o psiquismo humano, devido aos seus inúmeros conflitos internos, apresenta-se fragmentado. Existe uma parte de nós que é consciente e conhecida, enquanto outra permanece oculta e misteriosa. Há uma faceta que age com prudência e discernimento, e outra que pode ser impulsiva e até assustadora. Da mesma forma, enquanto uma parte de nós consegue controlar e dominar nossas tendências, a outra pode estar repleta de imperfeições e vícios que, por vezes, sobrepõem-se à nossa razão. Esta dualidade reflete a contínua luta interna que muitos enfrentam em sua jornada espiritual e evolutiva.

Joana de Angelis, através da série psicológica psicografada por Divaldo Franco, faz alusão ao pensamento de Carl Jung para elucidar aspectos profundos da psique humana. Segundo essa perspectiva, a parte desconhecida da personalidade abriga conteúdos psíquicos que o EU (ou SELF, conforme a terminologia junguiana) não reconhece conscientemente. Estes conteúdos estão armazenados no que é chamado de inconsciente profundo.

Este repositório oculto do inconsciente muitas vezes exerce uma influência poderosa sobre nossas ações e decisões, levando-nos, em certas ocasiões, a agir de maneiras que nos surpreendem e até mesmo contradizem nosso entendimento consciente de nós mesmos. É como se houvesse uma força interna, muitas vezes não reconhecida, que direciona certos aspectos de nossa vida.

Dada a influência profunda e, por vezes, misteriosa do inconsciente sobre o comportamento humano, não é surpreendente que o autoconhecimento tenha sido um tema recorrente nas parábolas de Jesus. Ele enfatizou a importância de olhar para dentro, de reconhecer e integrar todas as partes de nós mesmos, para viver uma vida mais plena e alinhada com o amor e a verdade divinos. 

Outro aspecto marcante da parábola é o sono que acomete todas as virgens. Mesmo estando equipadas com suas lamparinas, em determinado ponto da espera pelo noivo, todas adormecem devido à sua demora.

O sono, neste contexto, pode ser interpretado como uma metáfora para a inércia espiritual. Representa a estagnação e a inatividade do espírito, simbolizando a ausência do esforço contínuo e necessário para o autoconhecimento. Esse estado de "sono" reflete o comodismo, o desinteresse e o descaso na jornada de despertar da consciência. É uma postura passiva diante da vida e da evolução espiritual.

Essa inércia, simbolizada pelo sono, prende o ser humano ao estágio evolutivo em que se encontra, atuando como uma espécie de anestesia para a vontade e o ímpeto de crescimento. Em vez de avançar e buscar a iluminação e o entendimento, a alma permanece adormecida, perdendo oportunidades valiosas de evolução e aprendizado.

O momento em que as virgens são despertadas pela chegada inesperada do noivo é, sem dúvida, o clímax da parábola. Jesus, em sua maestria, utiliza simbolismos profundos e transcendentais para transmitir seus ensinamentos. A chegada do noivo à meia-noite não é um detalhe trivial. A meia-noite, marcada pelo encontro dos ponteiros do relógio, simboliza o fim de um ciclo e o início de outro. 

Dentro desse contexto, a chegada do noivo nesse momento específico sugere que o despertar espiritual pode ocorrer justamente quando menos esperamos, no limiar entre duas fases de nossa existência. É um lembrete de que a oportunidade para a transformação e o crescimento espiritual pode surgir a qualquer momento, e que devemos estar sempre preparados e vigilantes para recebê-la.

Nas cartas de Paulo aos Romanos, capítulo 13, versos 11-12, destaca-se a advertência do apóstolo do Cristo: “Reconheceis o momento em que viveis, já é hora de despertar do sono. A noite está avançada, o dia se aproxima. Rejeitemos, pois, as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz.”

A parábola aponta para o despertar da consciência, porque a humanidade já se encontra em condições de realizá-la. Ao despertarem, as virgens percebem que não podem mais seguir juntas, porque durante o sono suas lamparinas se apagaram e metade delas não tinha azeite suficiente para mantê-las acesas.

 As virgens insensatas representam as máscaras que criamos para sustentar nossas pseudo-virtudes. Quando o ser humano não busca o autoconhecimento, quando se recusa a aceitar-se, quando não se perdoa, alimenta para si falsas virtudes, numa tentativa ilusória de compensar-se, acreditando ser o que não é. 

Todo movimento ilusório, do ponto de vista psicológico, um dia perde o combustível e não consegue sustentar-se, levando o ser a experimentar, muitas vezes, um despertar doloroso, como aconteceu com as virgens que, só então, perceberam o quanto se equivocaram.

Surge, novamente, a necessidade de se autodescobrir, para o trabalho de transformação moral, abandonando as máscaras e todos os outros artifícios psicológicos que evitam o despertar da consciência, rumo a plenitude espiritual.

Por fim, pondere-se que a separação das virgens, retrata a divisão de um todo. No caso da parábola, metade luz, metade trevas. Neste aspecto, já advertira o Cristo: “Todo reino dividido contra si mesmo será destruído. Toda cidade, toda casa dividida contra si mesma não pode subsistir”. Mateus 12:25.

Jesus termina a parábola recomendando orai e vigiai porque não sabemos o dia e a hora.

Aproveitar a encarnação para o exercício do autoconhecimento é missão de todos aqueles que buscam os patamares superiores da vida. O relógio da imortalidade já marcou meia noite. É chegada a hora!




 

 

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

JESUS E O MOÇO RICO


O encontro de Jesus com o moço rico, registrado em Mateus, 19:16 a 24; Lucas, 18:18 a 25; e, Marcos, 10:17 a 25, surge como um autêntico convite à reflexão acerca dos valores que escolhemos para serem o epicentro de nossas existências.

De início, é digno de realce o gesto do jovem rico ao se dirigir ao encontro de Jesus. Estando ele na juventude e gozando de riqueza, pertencia à elite judaica. Em contrapartida, Jesus representava um homem do povo, circulando entre as fileiras da multidão composta por desfavorecidos, enfermos e indivíduos de reputação questionável. 

Naquela época, não era frequente que um homem abastado se entrelaçasse com as massas. Ainda mais incomum era alguém de posição social proeminente, como o jovem rico, procurar o aconselhamento de um homem simples do povo.

Jesus enfrentou intensas críticas e oposições por interagir com aqueles marginalizados pela sociedade daquela época. Como resultado, indivíduos de classes sociais mais elevadas, intelectuais e eruditos evitariam buscar Jesus em público. Caso sentissem a necessidade íntima de se conectar com ele, seguindo o exemplo de Nicodemos, o doutor da lei, procurariam-no sob o manto da noite, buscando o encontro discreto a fim de minimizar a exposição.

O jovem rico, entretanto, transcende a barreira do preconceito e procura Jesus à luz do dia, revelando, por meio desse ato, a magnitude de conflitos e inquietações que carregava consigo.

Ao se aproximar de Jesus, o moço lança imediatamente uma pergunta.


- Bom Mestre, que devo fazer para conseguir a vida eterna?


A pergunta visava a obter uma resposta que desvendasse o caminho para alcançar a paz interior. Afinal, é desafiador compreender por que um jovem rico estaria em busca do significado da vida eterna, a menos que estivesse à procura dessa serenidade profunda.

Jesus fixa o olhar no íntimo do jovem e, antes de responder, lhe esclarece: "Por que me chamas de bom? Não há bom senão um só, que é Deus.”

O Mestre recusa o título de bom e o redireciona para Deus, ilustrando que diante dos desafios do mundo, a busca primordial deve ser direcionada a Deus.

Logo após, Jesus responde ao jovem: "Se desejas alcançar a eternidade, observa os mandamentos: não furtarás, não darás falso testemunho, honra teu pai e tua mãe, não cometerás adultério, entre outros.”

Entretanto, o jovem reage com surpresa, assegurando ter sempre obedecido aos mandamentos. E ele acrescenta, indagando: "O que mais me falta?”

A pergunta evidencia que o jovem, apesar de cumprir os mandamentos conforme a tradição, não experimentava uma realização espiritual completa. Isso reflete uma realidade comum a muitos seres humanos, que mesmo dedicando-se ao estudo do evangelho e ao auxílio ao próximo, não conseguem alcançar a plenitude.

A razão reside no persistente domínio do antigo orgulho, da vaidade arraigada, do egoísmo duradouro e do ciúme enraizado, que continuam a influenciar as dinâmicas das relações humanas.

A realização da plenitude só se torna realizável quando o indivíduo consegue libertar-se de todas as suas falhas morais, sendo este um princípio universal.

Nesse contexto, Jesus indica ao jovem que é necessário ir além do que já havia sido mencionado.


"Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me".

Ao escutar essas palavras, o jovem partiu com tristeza, pois detinha muitas posses. O chamado de Jesus representava uma demanda que ele não estava disposto a aceitar, pois sua afeição por suas posses era forte demais para abdicar delas.

Disse, então, Jesus aos seus discípulos: "em verdade vos digo que é difícil entrar um rico no reino dos céus.  E, outra vez vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus”.

Essas palavras frequentemente foram mal interpretadas, levando à crença de que Jesus estava condenando a riqueza e os bens materiais.

Contudo, é evidente pelo próprio contexto que Jesus não estava condenando a riqueza, uma vez que os próprios discípulos compreenderam isso e, consequentemente, questionaram: "Nesse caso, quem pode ser salvo?”

Se o Senhor estivesse de fato condenando a riqueza, a pergunta do discípulo - "Quem poderá salvar-se?" - não faria sentido, especialmente porque os discípulos eram pessoas de poucos recursos.

O cerne do texto se concentra no desapego dos bens terrenos, uma qualidade que tanto ricos quanto pobres podem alcançar.

A prática do desapego em relação aos bens materiais abre espaço na disposição interior para o interesse nos valores espirituais.

O propósito do texto é convidar o aprendiz a deslocar o foco dos interesses dos bens materiais para os interesses espirituais no cerne da vida.

A centralização dos interesses na posse de bens materiais levou a uma sociedade profundamente materialista e consumista, com um forte apego aos bens terrenos.

Esse apego aos bens materiais se manifesta de maneira óbvia em diversos momentos, inclusive nos momentos mais simples e cotidianos. Seja na satisfação e alegria ao adquirir novos objetos, na necessidade de exibi-los, ou mesmo na tristeza que surge ao perder um bem.

O materialismo também se evidencia nas ações humanas quando se empenha em múltiplas atividades com fins lucrativos, muitas vezes em detrimento do descanso e do convívio familiar, visando acumular recursos para concretizar um determinado desejo de consumo. Da mesma forma, se manifesta quando sentimentos negativos emergem diante da impossibilidade de adquirir o que se anseia.

O encontro entre Jesus e o jovem rico é um episódio repleto de convites de natureza espiritual. 

O Mestre nos convida a sempre buscar Deus como solução para nossos conflitos; nos convida a empreender uma reforma íntima, eliminando as imperfeições morais que bloqueiam o desenvolvimento de virtudes genuínas; nos chama a praticar o desapego em relação aos bens materiais, e a nutrir valores espirituais, aprimorando nossas interações com os outros.

Isso porque o maior investimento que podemos realizar nesta encarnação reside no domínio dos sentimentos.



terça-feira, 27 de junho de 2017

A PARÁBOLA DO TESOURO ESCONDIDO E DA PÉROLA DE GRANDE VALOR



O Reino dos céus é semelhante a um tesouro oculto no campo, o qual certo homem, tendo-o achado, torna a esconder, e, transbordante de alegria, vai, vende tudo o que tem, e compra aquele campo" Mateus 13:44. O reino dos céus é semelhante ao homem, negociante, que busca boas pérolas; e, encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha, e comprou-a." Mateus 13:45-46.


 As parábolas apontam duas situações. Na primeira, um homem encontra um tesouro por acaso, pois não o procurava. Feliz com o achado, resolve vender tudo o que tem para adquirir aquele campo e, consequentemente, apossar-se do tesouro. 

Na segunda situação, o homem, um negociante de pérolas, está à procura de uma pérola de grande valor e, ao encontrá-la, vende tudo o que possui para adquiri-la. 

Jesus compara o Reino de Deus a um tesouro de valor incalculável, de modo que todos os outros interesses e prioridades escolhidas para a vida perdem completamente o significado diante do brilho desse tesouro. 

Alguns vivem uma experiência semelhante à do primeiro homem, que encontra o tesouro sem estar à procura dele; mas, ao encontrá-lo, transforma-se e dá um novo rumo à sua própria existência. 

É exatamente assim que acontece o despertar da consciência para a conquista dos valores espirituais. Muitos permanecem no mundo com todas as atenções voltadas exclusivamente para atender às necessidades da vida material, até que uma experiência libertadora lhes toque, despertando-os da anestesiante ilusão com que enfrentavam o mundo e apontando-lhes outro rumo. 

Foi assim com o filho pródigo de outra parábola contada por Jesus (Lucas 15:11-32). O moço desperdiçou bens materiais e a própria saúde para se saciar em atividades mundanas inferiores. Sem conseguir a satisfação que buscava, em um determinado momento de sua vida, ele "cai em si" e, ao fazer isso, passa a mobilizar todas as forças de sua alma para retornar à casa do Pai. 

Saulo de Tarso também vivenciou uma experiência libertadora. Sendo a esperança do farisaísmo, jovem, belo, atleta e poliglota, ele viveu uma experiência cósmica com o Cristo às portas de Damasco. Despertando das trevas exteriores e como alguém que encontra um tesouro sem o estar procurando, ele se transforma no Apóstolo Paulo, o "convertido de Damasco", alterando completamente o rumo de sua vida e abandonando tudo o que tinha para investir no tesouro encontrado. 

Foi assim também com Francisco Bernadone, que, ao despertar para os valores da vida espiritual e encontrar o tesouro que não buscava, deixou tudo para ir em busca dessa riqueza interior, transformando-se no Pobrezinho de Assis.

 O mesmo ocorreu com Maria de Magdala, Zaqueu e muitos outros heróis conhecidos, bem como inúmeros anônimos que, todos os dias e sem estar à procura, encontram seu tesouro escondido e dão um novo rumo à própria vida, felizes por terem despertado para os verdadeiros valores da existência. 

Na segunda situação apresentada na parábola, o homem está ciente da existência de uma pérola de grande valor e a busca ativamente até encontrá-la.

Assim como muitos de nós que já conhecemos o valor do Evangelho do Cristo, mas ainda resistimos a vivencia-lo. 

A proposta expressa na parábola é clara. Para cultivar virtudes e sentimentos nobres na intimidade do coração, é necessária uma tomada de atitude que implique em deixar de lado tudo o que até então era valorizado, direcionando as energias psíquicas para o aprimoramento moral. 

Cada um sabe o que valoriza na vida e para qual direção suas atenções se voltam. Se você não sabe, basta se autoobservar por um dia e logo notará que as forças da alm são mobilizadas para atender a caprichos, ociosidades, futilidades, vaidades, animosidades, feridas emocionais, orgulho, desejo de vingança, e vícios físicos e mentais, entre outros. A proposta da parábola é abandonar todas essas "riquezas" superficiais para cultivar o verdadeiro tesouro que reside dentro de nós. 

O cultivo do tesouro interno passa pela reforma íntima. A questão 919 do Livro dos Espíritos, neste sentido, é esclarecedora, apontando o autoconhecimento como medida prática para se conquistar a paz íntima. 

Jesus fez o convite e a doutrina espírita apontou um caminho, mas somente o esforço pessoal poderá operar a edificação moral, legítima e definitiva em cada um. 

Portanto, "esqueçamos o desperdício de energia, os caprichos da infância espiritual e cresçamos para ser, com o Pai, os tutores de nós mesmos". (Emmanuel, Vinha de Luz)