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segunda-feira, 20 de novembro de 2017

EDUCAÇÃO PARA A MORTE

                                                                    

Apresentando uma proposta pedagógica para a compreensão do tema, Herculano Pires, no livro "Educação para a Morte", descreve nas primeiras linhas do primeiro capítulo o episódio vivenciado pelo grande filósofo grego Sócrates, quando o júri de Atenas o condenou à morte. Sua mulher, ao tomar conhecimento da sentença, correu aflita para a prisão, gritando-lhe: “Sócrates, os juízes te condenaram à morte”. O filósofo respondeu calmamente: “Eles também já estão condenados”. A mulher insistiu no seu desespero: “Mas é uma sentença injusta!” E ele perguntou: “Preferirias que fosse justa?”
A cena evidencia a serenidade com que Sócrates enfrentou a própria morte e, ao mesmo tempo, o desespero da esposa diante do mesmo fato. As reações divergentes de Sócrates e de Xantipa, sua esposa, decorrem, sem dúvida, de um processo educacional: a educação para a morte está presente em Sócrates, enquanto ausente na esposa.
É curioso notar que a vida somente educa as criaturas para a vida, jamais para a morte. Aliás, para muitos, a mera menção desse termo é causa de sofrimento. E assim, desde o nascimento, o aprendizado do ser humano circunscreve-se às necessidades apresentadas pela existência material. 
Educa-se para falar, para andar, para comer, para os relacionamentos, para cuidar da própria higiene e da própria saúde. E no quesito saúde, a educação é dirigida apenas para a saúde do corpo, sem qualquer preocupação com a saúde correspondente à parte que é eterna, como os sentimentos, pensamentos e emoções. 
Durante toda a vida, as pessoas se preparam para realizações pessoais e profissionais, sem sequer se lembrarem de que os dias as conduzem à morte, um fenômeno inevitável que surpreende a todos aqueles que não se encontram com o devido preparo emocional e espiritual para vivenciá-lo. 
Por isso, Herculano Pires, no mencionado livro, na página 15, assinala que a educação para a morte não é nenhuma forma de preparação religiosa para a conquista do Céu. É um processo educacional que visa ajustar os educandos à realidade da vida, que não consiste apenas em viver, mas também em existir e transcender.
Pondera-se, assim, que o processo de educação se inicia com o autoconhecimento, impondo ao aprendiz o trabalho de conhecer a si mesmo e identificar no campo de sua tela íntima os objetivos da vida e o significado da morte. O autoquestionamento é um exercício salutar nesse processo. Quem sou eu? Quais sentimentos sustento em meu mundo íntimo? Que sentimentos me causam sofrimento? Que sentimentos me proporcionam felicidade? Qual é o objetivo da minha encarnação? O que tenho que aprender? O que estou fazendo para atingir esse objetivo? O que é morrer? Como é morrer? Que comportamento terei no momento da morte? E logo após? O que me impediria de deixar meu corpo? 
Meditar e refletir a respeito dessas questões é uma medida que conduz ao autoconhecimento. Neste ponto, a doutrina espírita apresenta-se como uma grande aliada no processo de educação para a morte. Por isso, destaca-se a importância da leitura do Evangelho, do Livro dos Espíritos, de "O Céu e o Inferno" e, enfim, das obras básicas e subsidiárias, as quais se apresentam como facilitadoras do processo de autoconhecimento. 
A doutrina espírita permite a compreensão de que todos somos espíritos eternos, em trânsito no mundo material para a aquisição de conhecimentos e experiências, com o objetivo de desenvolver faculdades e potencialidades divinas. Portanto, a morte não é um pesadelo nem um fenômeno ruim; pelo contrário, é uma necessidade, pois encerra uma etapa para que outra se inicie. 
Herculano Pires, no livro “A Evolução Espiritual do Homem”, afirma que viver é diferente de existir. Viver é ocupar-se apenas em atender às necessidades do corpo. Existir é priorizar a satisfação dos anseios da alma. Desconhecendo a sua realidade de ser cósmico, são muitos os que vivem somente para satisfazer as demandas da matéria, especialmente comer, beber, manter relações sexuais, adquirir fortuna e poder. Não percebem que o corpo físico é apenas um instrumento de trabalho do espírito em direção à perfeição. É por isso que as pessoas que vivem apenas para a matéria frequentemente experimentam um imenso vazio no coração. 
O ser que existe é aquele que busca o autoconhecimento e, à medida que trabalha pela sua transformação moral, sente crescer no coração a necessidade de atender e amar o próximo. O ser que existe compreende melhor os erros alheios e pratica o perdão. Distribui o bem que é possível e descobre que fazer o bem o torna feliz. 
Transcender é mais do que simplesmente viver. Portanto, estamos encarnados no mundo com o propósito de transcender. A roda das reencarnações, como é sustentado no hinduísmo, não chega ao fim até que o ser aprenda a transcender, o que implica ir além e ultrapassar a esfera material por meio do exercício do desapego. Isso envolve desapego em relação aos bens materiais, desapego dos relacionamentos afetivos, das ideias e das posições intelectuais, entre outros.
Por isso, em Mateus 16, 25-26, Jesus ensina que “quem quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a sua vida por minha causa, encontrará a verdadeira vida.”
Com tais palavras, Mestre enfatizava o equívoco daqueles que atravessam a existência física entregando-se exclusivamente às realizações do mundo material, já que a verdadeira vida reside no plano espiritual. Ganhar a existência material é aproveitar ao máximo a oportunidade da atual reencarnação para enriquecer-se espiritualmente com valores e virtudes ensinados e exemplificados pelo Senhor. 
A proposta de Cristo não é fácil, especialmente em uma sociedade capitalista que exalta a riqueza, o poder, a beleza e a juventude como os maiores valores da existência. No entanto, o Mestre nunca disse que seria fácil, mas afirmou ser possível. Ele também acrescentou: “Tenham bom ânimo, eu venci o mundo” (João 16:33). 
O espírito Emmanuel, no livro "Pensamento e Vida", conclui que morrer é mergulhar em si mesmo. Portanto, a educação para a morte é, sem dúvida, o melhor investimento que alguém pode fazer em seu próprio benefício. 
No livro "Obreiro da Vida Eterna", capítulo 19, há uma bela passagem que apresenta Bezerra de Menezes em uma tarefa de auxílio ao momento do desencarne de Adelaide. Observando a ansiedade de Adelaide nesse momento crucial, Bezerra a tranquiliza e lhe diz: "Morrer, minha irmã, é mais fácil que nascer. Quando chegou a minha hora de desencarnar, procurei manter-me tranquilo e concentrei toda a minha lembrança na passagem de Jesus e Lázaro. Pude ouvir a voz do Cristo dizer..." 
– “Lázaro, sai para fora!”
Concentrar-se na vivência dos ensinamentos do Senhor torna mais fácil ao espírito que está se desprendendo do corpo abençoado que lhe serviu como veículo de aprendizado na Terra. Isso lhe permite afastar-se do corpo e contemplar as maravilhas do sol radiante que estão reservadas para todos aqueles que vivem de acordo com as leis divinas. 
Morrer de forma tranquila e serena é, em grande parte, uma questão de educação espiritual e preparo interior.